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Foto do escritorCaio Beck

Método Paulo Freire de Alfabetização

História do Método


Aplicado há mais de 50 anos (1963), o Método Paulo Freire de Alfabetização foi testado pela primeira vez na cidade de Angicos, no sertão do Rio Grande do Norte. Há alguns anos, tive a oportunidade de participar de um evento em Portugal, onde membros do Instituto Paulo Freire relataram com detalhes essa incrível experiência, o que me fez vir até aqui e compartilhar com vocês.


A experiência, inédita no Brasil, tinha uma meta ousada: alfabetizar adultos em 40 horas de aula, sem cartilha. Mas não era só isso. Paulo Freire pretendia despertar a consciência política. Desafio lançado, Freire teve todo um contato prévio com os participantes, estudando suas realidades, as histórias de vidas e o contexto em que os aprendizes estavam inseridos. Um grupo de educadores esteve junto de Freire nesta experiência em Angicos.


Método Paulo Freire de Alfabetização
Método Paulo Freire de Alfabetização

Antes de tudo, é interessante ressaltar que naquela época, o nordeste que possuía aproximadamente 15 milhões de analfabetos (50% da população nordestina na década de 60). A primeira experiência foi realizada com 300 trabalhadores rurais, sem acesso à escola, e que formavam um grande contingente de excluídos da participação social. Angicos era uma cidade de 13 mil habitantes e 75% eram analfabetos.


“Já naquela época Paulo Freire defendia um conceito de alfabetização para além da decodificação dos códigos linguísticos, ou seja, não basta apenas saber ler e escrever, mas fazer uso social e político desse conhecimento na vida cotidiana”.

Explica Sonia, que é licenciada em Letras e Pedagogia, com mestrado e doutorado pela Faculdade de Educação da USP e coordenadora do Centro de Referência Paulo Freire (CRPF), entidade mantida pelo Instituto Paulo Freire.


O Patrono da Educação Brasileira aplicou um método de alfabetização baseado nas experiências de vida das pessoas. Em vez de buscar a alfabetização por meio de cartilhas e ensinar, por exemplo, “o boi baba” e “vovó viu a uva”, ele trabalhava as chamadas “palavras geradoras” a partir da realidade do cidadão. Por exemplo, um trabalhador de fábrica podia aprender “tijolo”, “cimento”, um agricultor aprenderia “cana”, “enxada”, “terra”, “colheita” etc. A partir da decodificação fonética dessas palavras, ia se construindo novas palavras e ampliando o repertório.


Uso das palavras geradoras no Método Freire de Alfabetização
Uso das palavras geradoras no Método Freire de Alfabetização

O método Paulo Freire estimula a alfabetização dos adultos mediante a discussão de suas experiências de vida entre si, através de palavras presentes na realidade dos alunos, que são decodificadas para a aquisição da palavra escrita e da compreensão do mundo.


“A concepção freiriana procura explicitar que não há conhecimento pronto e acabado. Ele está sempre em construção”.

Explica Sônia, que continua: “Aprendemos ao longo da vida e a partir das experiências anteriores, o que faz cair por terra a tese de que alguém está totalmente pronto para ensinar e alguém está ‘totalmente’ pronto para receber esse conhecimento, como uma transferência bancária." Esse caráter político, libertador, conscientizador é o diferencial da metodologia de Paulo Freire dos demais métodos de alfabetização.


Vale destacar que a experiência era voltada para adultos, mas participaram diversos curiosos, inclusive crianças e adolescentes. Eneide, filha de Severino e Francisca, frequentou as aulas em Angicos, quando tinha apenas 6 anos de idade, junto de seus pais. Ela lembra que as aulas eram encantadoras.


“Quando falava a palavra tijolo, a imagem que projetava era a de um homem construindo e utilizando tijolos”, para contextualizar.

Relação de Freire com os aprendizes adultos no Método de Alfabetização
Relação de Freire com os aprendizes adultos no Método de Alfabetização

Antonio Lopes, pedreiro e ex-aluno, diz que Freire era muito gentil com todos.


“Quando a gente sabe ler e escrever, a gente aprende muita coisa. Se eu não soubesse ler e escrever, não pegava nenhuma obra para fazer”.

Hoje, Antonio sabe ler e escrever, inclusive, guardou alguns livros da época. Antes que você pergunte “Mas e aí, deu certo? Por que não continuamos aplicando o método?“, saiba que Freire foi convidado pelo presidente da época (João Goulart) e pelo Ministro da Educação (Paulo de Tarso Santos), para repensar a alfabetização de adultos em âmbito nacional. Em 1964, estava prevista a instalação de 20 mil círculos de cultura para 2 milhões de analfabetos, porém, devido ao golpe militar que iniciava neste ano, Paulo Freire foi preso e exilado, e infelizmente, teve seu trabalho interrompido.


Independentemente das questões políticas e partidárias, o método é muito interessante e de fácil aplicação. E sim, utiliza muitos conceitos andragógicos, os quais defendem muitos educadores que tiveram contato com Paulo Freire, como é o caso de Pierre Furter, colega na Universidade de Genebra durante a década de 70 e que veio posteriormente ao Brasil para estudar e conhecer o método freiriano. Furter é um dos educadores que ajuda a conceitualizar a Andragogia.


Por curiosidade, saiba também que Paulo Freire voltou para a cidade de Angicos/RN, 30 anos depois. No dia 28 de agosto de 1993, Freire conversou com ex-alunos e monitores que o apoiaram durante a formação. Foram compartilhadas diversas histórias de pessoas que, inspiradas por Freire, voltaram a estudar, algumas inclusive, se tornam professoras. Apesar de aplicado entre jovens, adultos e idosos, o método também pôde ajudar na alfabetização e letramento de crianças, e em 40 horas, cerca de 300 pessoas aprendem a ler.


Paulo Freire, idealizar do Método de Alfabetização
Paulo Freire, idealizar do Método de Alfabetização

Como funciona o método?


O método Paulo Freire de alfabetização é dividido em três etapas: investigação, tematização e problematização. Na etapa de investigação, aluno e professor buscam, no universo vocabular do aluno e da sociedade onde ele vive, as palavras e temas centrais de sua biografia. Em Angicos, foram escolhidas uma média de 410 palavras, que foram descobertas através do bate-papo com os futuros aprendizes. Com isso, uma equipe de educadores define quais são as palavras geradoras.


Na segunda etapa, a de tematização, eles codificam e decodificam esses temas, buscando o seu significado social, tomando assim consciência do mundo vivido pelos alunos. É nesse momento que os educadores fazem associação das palavras com alguma situação cotidiana, conhecida por todos. Exemplo: A palavra ‘feira’ era acompanhada de uma imagem com uma mulher indo comprar ‘milho’, assim os estudantes associavam as palavras com algo que era comum para eles (a compra de milho na feira).


E no final, a etapa de problematização, aluno e professor buscam superar uma primeira visão mágica por uma visão crítica do mundo, partindo para a transformação do contexto vivido.

No método freiriano, segundo Moacir Gadotti, aprendiz de Freire e diretor do Instituto Paulo Freire, se decorria de um “processo de substituição de elementos reais por elementos simbólicos“, com a utilização de cartazes, projeções na parede, discussões e leitura, “sequência inversa à utilizada para crianças, em que a leitura figura como elemento instrumental de construção e enriquecimento dos círculos de representação mentais“.


Gadotti ainda diz: “No pensamento de Paulo Freire, tanto os alunos quanto os professores são transformados em pesquisadores críticos. Os alunos não são uma lata vazia para ser enchida pelo professor.” Isso é incrível e faz todo o sentido, seja na pedagogia, na hebegogia ou na andragogia. Não podemos esperar que nossos alunos cheguem em sala de aula sem sentimentos, experiências, histórias, motivações pessoais, preconceitos, etc.


O Reconhecimento



Freire ganhou 41 títulos de doutor honoris causa de universidades como Harvard, Cambridge e Oxford, morreu em maio de 1997, e em 2012 foi declarado patrono da educação brasileira. Recebeu também o Prêmio de Educação para a Paz da UNESCO, em 1986; está incluído no International Adult and Continuing Education Hall of Fame e no Reading Hall of Fame; além de diversos outros reconhecimentos. Muitas fontes afirmam que é o 3º autor mais citado nos artigos acadêmicos em todo o mundo, com sua obra Pedagogia do Oprimido.


“O legado que ele nos deixa, entre tantas contribuições, é de esperança”, destaca Sônia, que finaliza: “(…) um legado de entender a educação como espaço de transformação social, que nos ajuda não só a ler a história, mas sermos também escritores da história.”

As homenagens à sua personalidade e contribuições para a educação nas mais diversas áreas da mesma, encontram-se espalhadas por toda parte do mundo. Em países como África do Sul, Portugal, Estados Unidos e Canadá, por exemplo, há centros de estudos que possuem métodos que muito se assemelham às suas teorias em ensino e aprendizagem e que recebem, inclusive, o nome do próprio autor.


Análises de suas obras foram unanimemente traduzidas para idiomas além do Português com o objetivo de estender o legado de Freire. Na Finlândia, artigos científicos contendo estas características, foram escritos e publicados e logo após a tradução, somaram aproximadamente 20mil Downloads. Dentre suas célebres obras e sugestões de leitura, destacam-se; Pedagogia do Oprimido; Pedagogia da Esperança; Educação e mudança.


Por falar em obras, em breve, na Editora Andragogia Brasil, lançaremos uma obra que revisita as práticas pedagógicas (e andragógicas) do Patrono da Educação Brasileira. Enquanto isto, conheça as nossas obras lançadas e registre-se no Site para acompanhar as novidades.


Caso queira saber mais sobre o método Paulo Freire de alfabetização e teorias de outros educadores de adultos, sugiro o curso de Andragogia: https://hotmart.com/pt-br/marketplace/produtos/curso-avancado-de-andragogia/Q68581494O


Aproveito para recomendar um vídeo que gravei sobre Paulo Freire: https://youtu.be/q6fJY1BcoRA

 

Para referenciar o artigo, utilizar:

– Beck, C. (2016). Método Paulo Freire de alfabetização. Andragogia Brasil. Disponível em: https://andragogiabrasil.com.br/metodo-paulo-freire-de-alfabetizacao/


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